terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Lejano potrerito de la infancia... Recortes de mim mesmo.



Bombachinha larga que por vez ao corretear um cusco me enredo e caio, levanto e olho pra os lados: Ninguém viu...Um gaúcho não pode andar caindo de maduro.O barbicacho bem contra o queixo pra não voar com o vento... O petiço já ta encilhado grita o Wilso peão, aramador e amigo. Senta ai nessa calçadinha que vou te atar as esporas!!! Fico adimirando as voltas de tento sobre as botas e digo: qualquer dia quero que me ensines, quero atar sozinho!!!
Ta muito apertada? Olha que te corta a circulação do pé!...Não, ta boa!!!




Daí sim poco mais de metro de uma imponência se levantam, batendo com força os pés no chão para escutar o tilintar que faz as rosetas ao bater o taco da bota contra as pontas de pique bem sentadas de piso no galpão...




Ageito o banquinho, bem na altura do estrivo e alço a perna como gente grande, no alge dos meus 5 anos, pronto...Agora so um gigante, parece que sobre esse petiço posso qualquer coisa do mundo...




Vi o vô dizer ontem que tinha faltado umas ovelha do potrerinho, que era pra ir ali no Zezé (vizinho de cerca) e perguntar pra o Beca (caseiro) se os arames tavam bom e se naum tinha nenhuma por La... Me animei mais ainda, é mais perto pela estrada. E me gusta anda a cavalo sobre a estrada, gosto do barulho dos cascos contrabalanceando o chão batido de terra.




...Passada a porteira, que da para a carreteira, mais uns 400 metros por dentro do campo e: Bueno, apeiamos aqui na porta do galpão! O Beca deve de ta ai por dentro! É cedo e já largo as tambera, deve de ta fazendo o café!... Agora meu pensamento voa, fico olhando esse galpão de tijolo antigo com essas telhas de barro desbotadas e no interior sobre traves de paus arreios velhos judiados pelo suor... Adentramos, Ooo de Casa!!!... Opa passem no mas!
Aquele mundo tão gigante pra mim ainda guardava uma cozinha pequena nos fundos e depois dessa ainda uma pequena pecinha com um catre de madeira sob um colchão de lã socada, coberto por um lençol encardido... Que paz que me traz este lugar e este velho arrolhadito num banquinho, pequeno coberto por um peleguinho moro, bem na porta do fugão a lenha que mais fumaceia pra dentro do galpão que pela própria chaminé...Que admiração este homem me disperta, vivo ouvindo falarem: Que é o mais exímio aramador que já teve por estas bandas, que todo o aramador novo foi seu discípulo. Que cura um rebanho inteiro só com benzedura do alge do seu piqueteiro, e já vi cavalo que se contorcia com dor de cólica, minutos depois de seus ritos se levantar e seguir pastando como se nada tivesse acontecido... Cusco mordido de aranha, em dois dias não ter mais nem sinal...




Corta os meus pensamentos. Toma guri!! Com sua voz mansa que chega a da priguiça na gente me oferece de mão tremula um tijolinho... Um, brigado! tímido sai da minha boca, e enquanto descasco aquele doce, faceiro, vou perdendo o olhar na chaleira preta enferrujada soprando fumaça pelas ventas e no leite fervilhando numa cambona, em cima da chapa daquele fugão de lataria tisnada...




...Bueno então bamo lá!!!
O Wilso já pergunto tudo que tinha que sabe e nem vi, perdido nesse meu mundo de imaginação... Monto no petiço e garboso assobio e grito vamo passarinho!! Meu ovelheiro peludo se levanta e vem fazer festa na volta do pingo, fico me sentindo maior que o mundo, aquilo pra mim era como se não faltasse mais nada, a minha felicidade parecia que ia esplodir de tanto aumentar... Mas seguia sério: Um gaúcho não pode ta mostrando muito os dentes! e troteava do meu lado aquele cusco, que na hora da sesteada da peonada era meu companheiro de futebol.




Tomara que a inocência e a simplicidade desse guri não tenham desaparecido de dentro de mim, depois de conhecer o canibalismo de aparências do povoado, os falsos amigos e a ganância por estatus.




Marvyn Ribeiro
06/06/2011
Dom Pedrito

Nenhum comentário:

Postar um comentário